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Por Rogerio Ruschel (*)
Exclusivo para In Vino Viajas – O primeiro passo para se aproveitar os benefícios do enoturismo (que são relevantes para dezenas de segmentos econômicos) é parar de pensar isoladamente. No turismo isso representa um dos principais vetores de nosso gigantesco desperdício de oportunidades de geração de renda, empregos e valorização da cultura. Os outros dois são a clássica incompetência de grande parte dos gestores públicos (quase sempre politicos não re-eleitos) e a permanente falta de visão de longo prazo, porque tudo é feito para promover a re-eleição do secretário ou do ministro, e não para beneficiar a comunidade.
Não gostaria de ser repetitivo, meu prezado leitor, mas anote isso: na Espanha cerca de 42.000 vinícolas receberam 2 milhões de visitantes, gerando 50.000 empregos em 2014! Só o enoturismo recebeu quase 1/3 do total de visitantes ao Brasil em 2013! E para que você não tenha dúvida, a Espanha (como França e Itália), recebem cerca de 50 milhões de turistas por ano enquanto o Brasil está estacionado em oito milhões há mais de uma década! Mendoza, na Argentina, nosso vizinho, recebe mais de 1 milhão de visitantes por ano – e um dos grandes motivadores, além da neve, é a indústria vinícola.
Por isso ao entrevistar Ivane Fávero (na foto de abertura), ativa secretária de Turismo e Cultura de Garibaldi, cidade da serra gaúcha integrante da DO Vale dos Vinhedos, e que é também vice-presidente da Associação Internacional de Enoturismo (Aenotur) para a América Latina, fiquei feliz em perceber que ela também lamenta o isolamento: segundo ela, ”é chegada a hora de se constituir uma Associação de Cidades do Vinho no Brasil”. A Aenotur (logotipo acima) foi criada em maio de 2014 na Espanha com uma série de propostas, e atualmente conta com associados no Uruguai, Argentina, Italia, Portugal, França e Espanha; o Brasil participa com oito associados, entre os quais cinco municípios da serra gaúcha; todos os demais paises (exceto a Espanha) participam através de entidades que representam mais de 500 cidades, porque eles já aprenderam que somente a união faz a força.
A Aenotur pretende valorizar o enoturismo em relação a outros produtos turísticos em termos locais e internacionais – e somar esforços tendo uma associação de cidades produtoras de vinho poderia ajudar bastante no Brasil, porque no Brasil o enoturismo é invisivel para o poder público. E esta é outra percepção de Ivane Fávera (na foto abaixo com o presidente da entidade José Arruda Lopes e o prefeito de Garibaldi, Antonio Cettolin) revelada nesta entrevista exclusiva ao In Vino Viajas – veja a seguir.
Com quase 12 meses de existência quais os principais resultados práticos da Associação Internacional de Enoturismo (Aenotur)?
Fávera: “A Aenotur já conta com 14 associados em 7 países, que representam mais de 500 “cidades do vinho” e associações de rotas do vinho. Assim, neste primeiro ano, nosso trabalhou focou-se na estruturação da Aenotur, com a busca de associados, a estruturação do Portal oficial de Aenotur na Rede Web e um portal – www.winedestiny.com – que numa primeira fase será um Blog e, posteriormente, o portal internacional do enoturismo. Ademais se tem trabalhado na criação da Classificação Internacional de Enoturismo, que incluirá cidades, destinos e rotas do vinho para facilitar ao interessado no enoturismo a escolha do lugar a visitar e ajudar as cidades a desenvolverem uma oferta de serviços e produtos internacionais. Também se trabalhou na criação da identidade da própria associação. Para os próximos anos, deveremos ampliar o número de países/municípios associados.”
Como estão os planos para a implantação anunciada de uma Escola Internacional de Turismo?
Fávera: “A Aenotur pretende implantar uma Escola Internacional de Enoturismo virtual. Neste sentido, vem desenvolvendo um espaço virtual que neste ano incorporará 4 tipos de oferta formativa: enoturística, enológica, turística e de formação transversal. Os recursos técnicos, humanos e financeiros viriam dos próprios associados, de acordo com o interesse de cada um. Já temos um grupo de experts trabalhando na geração de conteúdo específico em enoturismo. A intenção é ofertar um curso básico, igual para todos os países, e que seja a base mínima que todos os que trabalhem em enoturismo devam conhecer”.
Porque o enoturismo brasileiro sofre tanto de pobreza promocional por parte de órgãos públicos e privados?
Fávera: “Tenho trabalhado, como Vice Presidente da Aenotur para a América Latina, no sentido de divulgar a associação e a importância de estarmos juntos com os principais destinos de enoturismo do mundo, mostrando a relevância deste segmento, ainda tão desvalorizado no Brasil. Até hoje, não temos uma linha sequer, no material do Ministério do Turismo ou da Embratur, vendendo o Brasil como destino de enoturismo, infelizmente. O Ibravin fez o Diagnóstico do Enoturismo Brasileiro e apoia o Salão do Enoturismo, junto ao Festival de Turismo de Gramado. É a única entidade que tem contribuído neste sentido. Entendo que os programas devam dar ainda mais destaque ao enoturismo, pois é o marketing mais efetivo do vinho brasileiro.
Com relação aos demais países, temos um grande número de “associados indiretos”, por meio das entidades que representam os destinos de enoturismo, como no caso de Portugal, Argentina e Uruguai, Itália ou Espanha. Esperamos que o feito de organizar o Congresso Latino Americano de Enoturismo (aqui – foto abaixo – e em outros países da AL) e o Congresso Internacional de Enoturismo (na Europa) possam servir para sensibilizar os organismos públicos brasileiros sobre o potencial deste segmento, tanto pelo número de turistas e divisas que atrai, quanto pela geração de emprego.”
Porque o Brasil não tem uma Associação de Cidades do Vinho? Quando e como poderemos ter uma entidade como essa?
Fávera: “Entendo que é chegada a hora de se constituir uma Associação de Cidades do Vinho no Brasil. Hoje temos vários municípios onde o vinho tem importância significativa, tanto econômica, quanto social e cultural, e estes precisam buscar o fortalecimento do segmento (vinho e enoturismo), por meio da união de esforços. Portugal é um bom exemplo da força deste tipo de associação, com a Associação de Municípios Portugueses do Vinho, associada à Aenotur. Possibilitar às vinícolas e às cidades do vinho conhecer outras experiências, o tipo de atividades que realizam e os problemas que podem encontrar, é um dos estímulos para a implantação da Associação Brasileira de Cidades e Rotas do Vinho. A Aenotur prevê, nos seus estatutos, um mecanismo para que, com a criação de uma associação com este escopo, esta passe a ser a representante do país na junta diretiva.”
Quais os principais resultados do 4o. Congresso Latino Americano de Enoturismo de outubro de 2014?
Fávera: “A 4ª edição do Congresso Latino Americano de Enoturismo alcançou seus objetivos, que seriam de discutir os fatores e segmentos que influem na competitividade e sustentabilidade da oferta enoturística, aproximando países enoturísticos da América Latina e Europa, enfatizando as boas práticas do setor. Também se apresentaram os principais elementos da oferta enoturística, que estão sendo incorporados na Classificação Internacional de Enoturismo, em elaboração pela Aenotur, com nossa participação. Neste encontro ocorreu, ainda, a assinatura do Termo de Adesão dos Associados da América Latina à Aenotur”
O que a Aenotur espera da 5a. edição do Congresso Latino Americano de Enoturismo, em setembro de 2015 no Uruguai?
Fávera: “O ano de 2015 reserva duas edições do Congresso. Uma Internacional, a acontecer em Portugal e Espanha, de 2 a 4 de julho, e outra no Uruguai, com o caráter Latino Americano que o evento tem desde sua primeira edição. Ambas vão debater a temática do mercado de enoturismo, a demanda, já que na edição anterior se abordou a oferta. A Aenotur tem trabalhado, apoiando os promotores locais de cada edição, desde a elaboração da programação até a promoção dos eventos. Nestes Congressos, organizaremos assembleias da entidade. Especificamente na Europa, se analisará o potencial emissor de enoturistas para o mundo dos seguintes países: Reino Unido, Alemanha, França, Rússia, China e Japão. Também se analisará, no âmbito da internet, o papel dos bloggers no desenvolvimento e atração de enoturistas.”
Qual a contribuição da Aenotur para a valorização da cultura do vinho?
Fávera: “A Aenotur foi criada com o objetivo de valorizar a cultura do vinho, por meio da atuação, nos mais diversos países. O Ecomuseu da Cultura do Vinho Dal Pizzol já solicitou adesão à Aenotur. Os museus do vinho do mundo serão divulgados, de forma conjunta, favorecendo a visibilidade dos mesmos. Novos projetos estão sendo estimulados, igualmente. Na Europa as associações de museus do vinho já estão avaliando a integração à Aenotur, quer seja diretamente ou por meio das cidades do vinho a que pertencem. Ademais, a Aenotur, através do conhecimento em inventariação do patrimônio vitícola que se tem realizado na Europa, incorpora o patrimônio natural, material e imaterial como elementos da Classificação Internacional de Enoturismo, fundamentais na atratividade de um destino enoturístico.”
Fotos cedidas pela Secretaria de Turismo e Cultura de Garibaldi
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(*) Rogerio Ruschel é jornalista e entende que o desenvolvimento do enoturismo (e do turismo em geral) deveria ser uma tarefa urgente e coletiva no Brasil.
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