Tempo de leitura: 7 minutos
Por Karina de O Noçais (*)
Exclusivo para In Vino Viajas – Quando comecei a escrever este post sobre Bordeuax consegui umas fotos antigas com a família Guignard, e quando as mostrei para o Rogerio Ruschel, editor do In Vino Vianas, ele decidiu começar esta história mostrando algumas delas – como a que abre este post, uma cena da vindima na propriedade Guignard em uma época não identificada, mas provávelmente nos anos 1950.
Quando falamos em Bordeaux alguns pensam que é uma denominação de origem controlada da França (AOC). Isto está certo, mas na verdade dentro da região de Bordeaux existem 57 AOC’s – e Medoc, na foto acima, é uma delas. Trata-se do maior vinhedo demarcado em extensão do mundo, que produz 660 milhões de garrafas todo ano – e garrafas de alta qualidade, é claro. Isso quer dizer que quem gosta teria que beber muito vinho para poder conhecer cada uma das sub-regiões, sendo as principais Médoc, Entre-Deux-Mers, Graves, Sauternes, Saint-Emillion, Barsac e Libournais. São vizinhas entre si, mas produzem vinhos diferentes. Veja o mapa abaixo.
O terroir é o grande responsável por essas diferenças – sutis mas importantes – entre os vinhos, já que temos uma superfície muito grande e muitas diferenças geográficas e assim temos uvas completamente diferentes em um mesmo lugar. Na foto abaixo, dos anos 1950, os Guignard preparam seu terroir
Além das diferenças entre uvas de mesmo tipo, temos a possibilidade de fazer o corte (mistura entre as uvas diferentes, blend em inglês), entre 5 tipos principais que são cabernet sauvignon, merlot, peti verdot, malbec, cabernet franc e carmenère, sendo as três primeiras as mais usadas. E o blend é parte da arte francesa de produzir vinhos, e um dos segredos dos produtores de Bordeaux, como a família Guignard que produz vinhos há 400 anos em Graves, a quem pertencem estas fotos antigas. Aliás, para quem diz que a mulher entrou no mercado de trabalho só recentemente, veja abaixo duas fotos “modernas” de agricultoras dando duro nos vinhedos de Bordeaux.
Voltemos ao blend. Hoje além de ser professora de francês e sommelier, trabalho representando comercialmente no Brasil uma vinícola de Bordeaux da região de Graves, a Sélection Guignard, uma empresa tradicionalíssima, que produz um dos vinhos mais conhecidos da região e talvez o mais antigo. Nesta foto abaixo dá para ver o que hoje chamaríamos de “parte da frota de logística de distribuição de vinhos em Bordeaux”…
A Selection Guignard é administrada por uma família que está no ramo de vinhos há mais de quatro séculos; hoje três irmãos cuidam dessa propriedade (na foto abaixo, o pai deles). No lugar onde foi a casa da família no passado, hoje é a sede da empresa.
Na foto abaixo Monsieur Guignard, o pai dos irmãos que hoje administram a empresa, examina as videiras no vinhedo tendo ao fundo o château de Roquetaillade, propriedade da familia.
Como para quem gosta de vinhos é uma oportunidade fantástica conhecer uma experiência bordolesa de 400 anos, pedi a Bruno Guignard, um dos filhos e o enólogo da empresa para compartilhar um pouco de sua experiência conosco. Ele não é de falar muito, mas consegui algumas respostas.
Karina: O que você faz na Séléction Guignard?
Bruno: Sou o enólogo, sou responsável pela colheita, a vinificação e do cultivo do vinho. Sou responsável também por alguns mercados como Ásia, Russia e Brasil.
Karina: Qual é o segredo para fazer um bom vinho?
Bruno: Infelizmente não há uma receita milagrosa para fazer um bom vinho. Se houver um segredo é o terroir! É a base de tudo.
Karina: Qual a importância do enoturismo para a Séléction Guignard?
Bruno: Bordeaux é uma região que vive da vinicultura, dos vinhos, da gastronomia e do turismo. Bordeaux foi a primeira região vinícola do mundo a criar um roteiro para visitantes. Para nós é uma coisa muito boa. Além das atrações tradicionais na região (uns 30 roteiros diferentes) hoje há um percurso de vinhos de Graves e de Sauternes (http://www.bordeaux-graves-sauternes.com/) que proporciona ao visitante toda a experiência que a cultura do vinho pode nos oferecer é a primeira em Bordeaux que em um lugar só encontramos o que precisamos, meu irmão Dominique é que está à frente desse projeto. Na propriedade nós recebemos visitantes, mesmo no fim de semana e o durante o verão. Os amantes de vinho gostam muito de encontrar os viticultores e de entender como se faz o vinho.
Aqui no Brasil a Vinho e Ponto tem alguns dos vinhos da Selection Guignard como o Château Roquetaillade La Grange tinto 2009 e o Château Le Bernet tinto 2010 e branco 2013.
Uma cidade encantadora
O que eu faço é apaixonante, pois com o francês eu dou aula no Brasil, sou guia turística na França e tenho um contato direto com meus vinhos prediletos, os de Bordeaux. Bordeaux é uma cidade que tudo nos inspira a tomar a bebida de Baco. Tinto, branco ou rose, o vinho está por todos os cantos e centenas de bares e restaurantes, além da “Maison du Vin” onde acontecem cursos, degustações ou você simplesmente pode tomar vinho em taça das regiões de Bordeaux. Pelas ruas encontramos algumas vinhas em restaurantes na entrada ou podemos visitar o museu do vinho, ou ainda conhecer o porto que foi o primeiro da França. Abaixo, a Place de La Bourse.
Em Bordeaux temos atrações para todos os gostos, já que tudo tem história. É uma região que por muito tempo pertenceu aos ingleses, então podemos aprender um pouco da história desses países. Com uma arquitetura deslumbrante – e uma grande área tombada como Patrimonio da Humanidade pela Unesco – ela encanta a todos que a visita, e mesmo para os que não gostam tanto de vinho, é um passeio incrível. A primeira vez que fui à Bordeaux achei que em três dias poderia conhecer esse lugar, mas hoje sei que precisamos de muito tempo para termos uma ideia de como é rica essa região na cultura do vinho e de história juntos. Tive uma vantagem: conhecer a língua francesa me ajudou muito, uma vez que saindo de Paris o inglês fica mais raro de encontrar e os cardápios com especialidades da região francesas são mais específicos.
O enoturismo é muito difundido na região de Bordeaux, e podemos conhecer vinícolas com hora marcada no “Office du Turisme”. Muitas vinícolas também recebem visitantes em inglês, mas com menos horários do que as visitas em Francês, e se você quiser visitar os grandes nomes tem que fazer as reservas o quanto antes para conseguir. O passeio pode ser feito de carro, de bicicleta e desde o ano passado uma empresa de barcos está fazendo esse passeio de uma forma luxuosa e confortável (veja em http://www.rubiatur.com.br/). Na Gare Saint Jean, na foto acima, você encontra linhas de trens para toda a França e de bondes na cidade.
Todo esse cenário fica ainda melhor quando estamos sentados em um dos restaurantes ou brasseries “bordolais” com uma taça de vinho e degustando um dos pratos regionais como o “Entrecôte à la Bordelaise” ou em um café comendo um “Cannelé” com os aromas de um lugar que é mágico. Espero que tenham gostado desse pequeno passeio pelos vinhedos e histórias de Bordeaux.
(*) Karina de O Noçais (karina.nocais@yahoo.com.br) é formada em Letras pela pela PUC-SP e professora de francês; formada em um curso de Sommelier pela ABS, trabalha com vinhos de Bordeaux.
Link permanente
Adorei…
Link permanente
Merci, Henry