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Por Rogerio Ruschel (*)
Quando estive lá pela primeira vez, em 2010, já conhecia a história e por isso me pareceu ver o fiscal com forte sotaque português, do alto de sua farda de autoridade, gritando para os barcos que chegavam apinhados de mercadorias: ”Ver o peso! Ver o peso! Ver o peso!”.
Na verdade essa deveria ser a cena provável em 1627 naquele local onde eu agora tentava entender o que estava acontecendo: a Casa do Haver-o-Peso
no cais implantado na confluência do Rio Guamá com a Baía de Guajará da então Feliz Luzitânia,
hoje Belém, Pará.
Pois é: os portugueses, índios, espanhóis, negros, caboclos, mestiços e brasileiros resultantes de todas estas etnias, não tinham como escapar: chegando com os barcos repletos de produtos dos rios, da floresta ou da agricultura, tinham que pesá-los e conforme o peso, pagar os devidos impostos para a Capitania do Pará.
A Casa do Haver-o-Peso funcionou até 1839 quando foi desativada e arrendada para a venda de peixe fresco. Em 1847,com o término do contrato de arrendamento, foi demolida e em seu lugar iniciada a construção do Mercado de Peixe (ou de Ferro) abaixo, e do Mercado da Carne (ou Municipal).
Hoje, quase 390 anos depois, o Mercado Ver-o-Peso continua a ser uma feira livre muito doida que mistura pessoas, culturas, cores, sons, sabores e mercadorias, mas foi crescendo com a cidade e se tornou um grande Complexo que abrange a Feira do Açaí; a Ladeira do Castelo; as praças do Relógio, do Pescador e dos Velames; o Solar da Beira e o Mercado Municipal. Todo este conjunto foi tombado como Patrimônio Histórico Nacional pelo IPHAN em 1977.
O Mercado de Ferro (ou Mercado do Peixe) foi construído pela empresa La Rocque Pinto & Cia, vencedora de uma concorrência pública realizada em 1897, e foi todo transportado da Inglaterra (de onde veio também o relógio da Praça do Relógio – veja abaixo) e montado em Belém.
O povo na época se exibia muito com esta origem “nobre” do Mercado do Peixe da cidade. Com suas quatro torres e elegantes escadas em espiral (abaixo), sua estrutura metálica de zinco veille-montaine seguindo a tendência francesa de art nouveau da belle époque, cobre uma área de 1.197 m² e pesa cerca de 1.130.000 toneladas e foi inaugurado em 1901. (Para ver outro mercado similar a este, construído pelo autor da Torre Eiffel em Dijon, França, acesse
http://invinoviajas.blogspot.com.br/2013/05/feira-livre-de-dijon-produtos-naturais.html)
Então vamos ao conteúdo: os peixes – peixes do mar e dos rios amazônicos, como o pirarucu, meio avermelhado e que deve ser parente do bacalhau, mas é mais saboroso do que ele; é o maior peixe de escamas do Brasil chegando a pesar 80 quilos e pescado com anzol! Mas tem também tucunaré, tamauatá, caranguejos, xaréu, curimba, aruanã, cachorra, corumbatá, jaú, mantrinxã, piaus, surubim, pirara e muitos outros peixes com nomes indígenas sonoros e carregados de poesia.
A feira livre do
Ver-o-Peso é a maior da América Latina – e provavelmente a mais caótica também, um verdadeiro caos organizado. Como não poderia deixar de ser, tem de tudo, de todo jeito, com todas as cores, aromas e sabores. Tem jambu, um folha conhecida por deixar a boca dormente e que está presente em vários pratos da culinária do Pará. Tem farinhas com texturas e sabores variados (veja abaixo), sementes, cascas e pós, verduras, palhas (muitas palhas com muito trabalho criativo), plantas estranhas, pinturas, cerâmicas, cereais, artigos artesanais, pimentas – muitas pimentas, algumas muito furiosas, como esta ilustrada abaixo.
Tem frutas amazônicas criativas no nome, cor e sabor como graviola, tucumá, piquiá, cupuaçu, mangaba, muruci, uxi, sapotilha, biribá, guaraná, pupunha, castanhas, bacuri. E tem o Açaí (abaixo), uma fruta de palmeira que chega em barcos cedinho de manhã, coberto com folhas de arumã: sozinho, o Açaí tem uma feira inteira para ele no
Ver-o-Peso – o que não espanta, porque no Pará o Açaí tem poesia, pintura, lendas e até mesmo uma dança exclusiva para ele.
O Mercado Ver-o-Peso tem outras maravilhas esperando por você: a medicina popular. São dezenas de barracas oferecendo plantas, cascas, raízes e ervas aromáticas e produtos prontos como remédios, unguentos, cremes e sabonetes florestais (veja abaixo). Vendedores podem fazer o papel de médicos ou benzedores – ou quem sabe magos da floresta? Se você tem um problema, no Mercado Ver-o-Peso você vai encontrar a solução. Tem até viagra natural!
Mas o entorno do Complexo Ver-O-Peso é também riquíssimo em termos arquitetônicos, históricos e antropológicos, vamos dizer assim. No cais nas margens, o que se vê é uma floresta de mastros, bandeiras, bandeirolas, redes e corda
Em terra, ao redor do complexo, estão sobrados e sobradões portugueses (alguns disfarçados de varejos populares), a Igreja de Santo Alexandre – uma capelinha de taipa de 1653, a Igreja Matriz de Belém – também uma capelinha de taipa de 1771, e um forte construido em 1616.
Agora imagine esta região recebendo mais de um milhão de pessoas durante a festa religiosa Cirio de Nazaré (detalhe abaixo), a maior do Brasil! É verdadeiramente um espanto, um feito do qual os paraenses devem se orgulhar muito.
Um almoço no Complexo Ver-O-Peso é no minimo uma atração turística, desde que você seja cuidadoso com as pimentas. Você pode pedir por exemplo, um prato com arroz coberto por vatapá, maniçoba e caruru. O caruru paraense é uma espécie de pirão cremoso que tem por cima camarão seco e salgado com o bonito do jambu (abaixo), a tal folha que deixa a língua dormente nas laterais.
Você pode pedir tacacá – muito popular – que é a combinação de goma de tapioca, caldo de mandioca (tucupi), jambú e camarão seco é servido numa cuia (veja abaixo). Ou o tucupi tambem vendido em garrafas (abaixo). E para harmonizar talvez um suco natural, de uma fruta exclusiva do Pará, algo assim como um suco de bacuri?
O Mercado Ver-o-Peso foi bastante valorizado durante o Ciclo da Borracha, entre o final do século XIX e começo do século XX, quando a cidade de Belém teve grande importância comercial e internacional e sofreu grandes mudanças urbanísticas. São deste periodo, prédios históricos como o Palacio Lauro Sodré (atual Museu do Estado do Pará), o Teatro da Paz (abaixo) e o Palácio Antonio Lemos.
(*) Rogerio Ruschel é jornalista, consultor em sustentabilidade com 5 livros e 28 estudos e gosta de mercados livres e cultura popular.
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Oi, Rogerio. Tudo bem? 🙂
Seu post foi selecionado para a #Viajosfera, do Viaje na Viagem. Dá uma olhada em http://www.viajenaviagem.com
Até mais,
Natalie – Boia
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Ola Natalie, tudo bem? Olhei e não achei nada. Você tem o link? Grato, Rogerio