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Por Rogerio Ruschel
Meu caro leitor ou leitora, veja esta simpática história. Em 1933 três cachos de uvas Niagara rosados surgiram no meio do plantio de uvas Niagara Branca cultivadas desde 1910 numa grande área de terras que se chamava Jundiahy, uns 80 quilometros da cidade de São Paulo. Esta mutação natural foi encontrada pelo viticultor Aurélio Franzini nos vinhedos de propriedade de Antônio Carbonari localizada no atual bairro Traviú, em Jundiaí/SP. Conta a lenda que a emoção foi tão grande que o proprietário das terras pegou um pedaço de camisa e o amarrou no galho para marcar o local; ele sabia que a Niagara Rosada era uma uva diferente de qualquer outra uva do mundo.
Pois ser assim diferente, meu caro leitor ou leitora, o produto tem valor (desde que o mundo saiba disso). E a partir de 1935 a Niagara rosada começou a ser plantada em maior escala, foi se espalhando, sendo melhorada, reproduzida. E hoje, 90 anos depois, a região original Jundiahy está distribuída entre 5 municípios do Ciruito das Frutas (Jundiaí, Louveira, Itupeva, Jarinu e Itatiba) e foi finalmente reconhecida com uma Indicação de Procedência, que é uma das formas de autenticação de Identidade Geográfica – IG no Brasil (esta é a 102ª IG registrada no INPI). E o selo leva o nome antigo da região: Indicação de Procedência Jundiahy, com “h” e “y”.
O processo de reconhecimento como uma IG teve sua primeira reunião em 2009. No início de 2022 o INPI teria solicitado que a grafia fosse trocada por Jundiaí, o que foi descartado pelos produtores. Francisco José Mitidieri, auditor fiscal do Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa) que trabalhou com a metodologia do processo informa que “Essa grafia com ‘y’ foi o ponto de união dos municípios que produzem a uva atualmente. Eles se reconhecem como membros daquele território, por produzirem a uva niagara rosada, terem colonização parecida e na mesma época, cultivarem no mesmo solo. Eles têm uma sensação de pertencimento”, afirmou.
O processo tramitou 14 anos porque é necessário que os interessados comprovem uma série de coisas como definir técnicamente a espécie da uva, atestar a notoriedade da região neste cultivo, preparar um caderno técnico e comprovar a inserção dos produtores na delimitação geográfica que demandou a IG. E só depois disso tudo é que em 4 de abril de 2023 o Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI) concedeu a Indicação Geográfica (IG) da uva niagara rosada de Jundiahy, na categoria Indicação de Procedência.
Rene José Tomasetto, presidente da Associação Agrícola de Jundiaí, disse que os cinco municípios contemplados pela IP reúnem entre 700 e 800 produtores de uva. Ele contou que a primeira festa da uva na região aconteceu em 1934, logo após a descoberta da uva rosada. “Antes só existia a uva branca por aqui.” A Festa da Uva se realiza entre janeiro e fevereiro, no centro de exposições que tem o nome de Antônio Carbonari, o agricultor que amarrou as camisa nas videiras que apareceram cor de rosa em sua propriedade, 90 anos atrás.
A concessão foi divulgada dois dias antes da instalação do Fórum de Indicações Geográficas e Marcas Coletivas do Estado de São Paulo, que vai ser realizada dia 6 de abril, na Superintendência de Agricultura e Pecuária de São Paulo.
A uva Niagara Rosada é de mesa e pode atrair mais turistas à região. Isabel Harder, diretora de Agronegócio da Prefeitura de Jundiaí informa que “Agora vamos iniciar um processo de divulgação e valorização dessa indicação de procedência. A gente sabe que nossa uva tem um aroma marcante, mas agora queremos provar isso”.
É verdade: só ter a Identidade Geográfica não agrega valor à uva, é necessário informar o mundo que ela tem sabor melhor e só existe naquela região, e que por isso tem maior valor monetário. Desejo muito sucesso neste novo processo que começa agora; espero que não demore outros 14 anos.
Foto: Prefeitura de Jundiaí