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Por Paulo Antunes, texto e fotos; Rogerio Ruschel, fotos do Brasil (*)
Exclusivo para In Vino Viajas – Sempre que se regressa de uma viagem é praticamente impossível se livrar de um certo estado de sonho, por tudo aquilo que se viu e vivenciou – como observar Paris do alto da Igreja de Sacré-Coeur de Montmartre, um dos prédios mais fotografados na França, acima. É também uma ótima oportunidade para fazer algumas reflexões sobre o turismo e os valores que são incorporados por essa que é considerada uma indústria jovem, moderna e dinâmica. Nesse sentido é de se destacar como a Europa (acabo de voltar da França e Espanha) promove e cultiva o turismo com a chamada “coisa velha”. Sítios arqueológicos, edificações (como o Parque Guell, de Gaudi, em Barcelona, abaixo) de civilizações e impérios são valorizados cada centavo de euro.
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Não é exagero dizer que os visitantes encontram uma verdadeira enciclopédia viva com monumentos, museus, templos, arte, arquitetura, entre tantos outros aspectos que compõem os mosaicos culturais das nações e da vida dos povos ao longo dos tempos. Ao cabo de uma jornada, por qualquer cidade ou país, não há como não reconhecer que ao viajante foi oferecido uma celebração à cultura, história e arte! (Veja abaixo a Praça de Espanha, em Sevilha).
Esses, talvez, sejam os aspectos relevantes da chamada indústria do turismo na Europa, o “velho continente”. Há na verdade uma enorme habilidade em se apropriar dos patrimônios e colocá-los a serviço da moderna, ágil, contemporânea economia de viagem, que está antenada com as necessidades presentes e com o futuro. Os hotéis, restaurantes, museus, quase que invariavelmente contam com acesso livre à rede de internet, por exemplo!
Satisfação – Os números informam que os indicadores da indústria do turismo são impactantes. Paris continua sendo o principal destino do turismo no Planeta, a Torre Eiffel é daqueles monumentos onde a visibilidade da “babel” de culturas é gritante. E assim também ocorre em outros monumentos museus, templos parques e ruas da própria França, mas também na Itália, Espanha, Inglaterra, Alemanha entre outros – como Alhambra, em Granada, Espanha, fotografada de noite, abaixo.
As filas nas bilheterias dos museus, catedrais e castelos, os contingentes de pessoas passeando pelos parques, só reforçam que o interesse dos visitantes pelas atrações é praticamente inesgotável, porque sempre renovado. É mostra de que a roda da fortuna gira e pela força da boa propaganda, é capaz de oferecer sobrevida continua da atividade porque tem como mote principal, oferecer satisfação às pessoas. E isso, faz toda a diferença. (Abaixo, a baía de Cassis, na Costa Azul francesa).
Claro que isso também faz parte dos fatores mobilizadores de outras modalidades de turismo; os parques da Disney, por exemplo. Mas na Europa, na verdade, essas páginas da história humana, são receptáculos das criações que dignificam o humanismo, e em muitos casos alcançam, ou quase, os píncaros do divino, do supremo.
O fato é que por algum motivo, contingentes imensos de seres humanos são mobilizados a se deslocar de seus países, regiões para estar diante da criação de um Da Vinci, Rembrandt, Goya, Picasso, Salvador Dali, Renoir, Van Gogh, visitar monumentos, catedrais, palácios, castelos. É bem provável que a preservação e disponibilização de forma adequada, desses cenários históricos, culturais, temáticos sejam os fatores determinantes para esse afluxo de milhões de pessoas todos os dias, durante todo o ano. Abaixo, o corredor central do Museu D’Orsay, uma estação de trem que envelheceu e ao invés de ser demolida (a solução brasileira), foi transformada em um dos melhores museus do mundo.
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E, aí, talvez esteja a explicação para o bem sucedido negócio do turismo no velho continente. Não só. Afinal, não é possível deixar de lado que muita gente incorpora em suas visitas culturais outras facetas inegociáveis de uma viagem. A gastronomia, interesse pela geografia e pela natureza, sem menosprezar as compras.
Patrimônio natural – E o Brasil, o que anda fazendo com o seu turismo? É bem verdade que o nosso país não é dotado de “tanta história”, de milênios como o velho continente. Mesmo assim, ao que parece, os testemunhos do Brasil Colônia, do Império, não são suficientemente valorizados para se tornar um potente segmento do turismo cultural. Abaixo, o mercado Ver-o-Peso, em Belém do Pará, conjunto de prédios com mais de 320 anos e Patrimônio Histórico Nacional desde 1997. Mesmo sendo o portal ambiental e cultural da Amazônia, se mantém quase inteiro apenas porque sedia feiras de produtos e alimentos.
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Além do mais, se não possuímos patrimônio histórico rico, amplo e longevo, em decorrência de sermos uma “nação jovem” para os padrões europeus, também é verdade que aquilo que existe não recebe o tratamento adequado. As notícias e constatação da degradação do patrimônio do Barroco Mineiro, em especial as esculturas de Aleijadinho e o fechamento do Museu da Independência, em São Paulo, sem data para abrir as portas, são evidências de que não é assim que vamos salvar a lavoura do turismo nacional. Na foto abaixo, de Sabrina Schuster, uma familia de moradores de Nova Petrópolis, Rio Grande do Sul, que preserva sua cultura germânica como patrimônio cultural coletivo.
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De onde, então? Cantado em verso e prosa está o chamado patrimônio natural, que de fato é um dos grandes atrativos e objeto de interesse dos visitantes de diversas partes do mundo ao nosso país. E, como tem sido tratada essa matéria prima essencial para o nosso turismo? Pelos relatos, sabemos que não muito bem. Aliás, para desespero, acabamos de nos recusar a assinar um documento da ONU que propugna pelo futuro fim do desmatamento, uma das nossas mazelas ambientais. Na foto abaixo, um momento do outono da serra gaúcha, um patrimônio natural e enoturístico sub-aproveitado.
Refletir e comparar é bom – Sem pretender formular uma tese sobre o sucesso do turismo europeu e muito menos afirmar que tudo aqui no Brasil está ruim, após uma viagem não há como não fazer comparações e refletir. Tomar como inspiração, o exemplo europeu.
A preservação, proteção do patrimônio histórico é parte da história de sucesso. Há também outros aspectos, relevantes, que não podem ser descartados: a inclusão na rota do turismo da produção tradicional do continente europeu (vinho, azeite, queijos, perfume, artesanato, entre tantos outros); a modernização da hotelaria; a disponibilização da culinária, de forma a atender a uma gama maior de pessoas, com o chamado “cardápio do dia”, mais econômico, amigável e palatável para gostos e bolsos. As redes de transportes (trens, metros, aviões) que funcionam de forma exemplar, são também aspectos determinantes que fazem a economia europeia encontrar no turismo um excelente meio de produção de riqueza. Abaixo, um recurso turístico belíssimo e com grande potencial: o Parque Nacional Lençóis Maranhenses, um deserto tropical com lagoas que secam e peixes que “surgem.
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Há muitos outros aspectos que podem ser enumerados – que para determinado tipo de público pode fazer a diferença, mesmo que não percebidos de forma racional -, tais como, a limpeza e a sinalização das cidades. A facilidade de locomoção com o oferecimento de mapas impressos ou inseridos na malha urbana. Mobiliário urbano (lixeiras, vasos, floreiras, pontos de ônibus). Entre esses itens o grande número de bancos para o descanso, contemplação, trazem uma enorme contribuição. A comunicação visual de forma a não impactar o olhar, edificações que não ultrapassam um certo gabarito de altura de forma impedir a perspectiva e o horizonte.
O primeiro passo parta melhorar é avaliar, reconhecer os erros e decidir corrigi-los. Você concorda?
(*) Paulo Antunes (pauloantunes@uol.com.br ) é jornalista, cinéfilo, pesquisa a história do cinema e é um viajante observador. Rogerio Ruschel é jornalista, enófilo, pesquisa a cultura do vinho e é editor deste blogue. E ambos são ambientalistas.