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Por Rogerio Ruschel
Exclusivo: Entrevista com Ariadne Tamm Sakkis, Editora de Conteúdo da Agência CNI de Notícias e diretora da Série “O Brasil que a gente produz” sobre produtos com Indicação Geográfica
Meu caro amigo ou amiga, se você pensa que a CNI – Confederação Nacional da Indústria – a poderosa organização que representa mais de 20% do PIB brasileiro – só transita em grandes prédios industriais, ruas asfaltadas e salas atapetadas, precisa conhecer outro lado de sua atuação, o que valoriza a indústria de pequeno porte nos rincões do país. Neste “lado B” está, por exemplo, a redescoberta dos patrimônios escondidos de brasileiros revelados em produtos com Indicações Geográficas – IGs, certificados de origem e identidade que distinguem produtos como vinho, café, renda, queijo, arroz, banana, camarão, pedra, cachaça, tecnologia, cajuína, goiaba, café, cacau, uva, biscoito, guaraná… Enfim, atualmente são mais de 70 produtos reconhecidos como portadores da identidade de uma determinada região do país, alguns em locais inesperados. Como por exemplo, a farinha de Uarini, produzida em vilarejos como os da foto de abertura desta matéria.
Foi o que descobriu um pequeno grupo de jornalistas mobilizados pela jornalista Ariadne Sakkis que em novembro de 2018 viveu momentos de aventura para chegar a Uarini, uma comunidade com 13.000 habitantes no coração da Amazônia, na Reserva de Desenvolvimento Sustentável Mamirauá, distante 600 Kms de Manaus. Nesta aldeia, cerca de 2.000 pequenos agricultores, pequenos industrializadores e pequenos empreendedores criaram um pólo de excelência na produção de uma farinha de mandioca artesanal. A farinha, já famosa no Norte e junto a admiradores e chefs de cozinha, estava em processo de reconhecimento no Instituto Nacional de Propriedade Industrial –INPI para ser uma Indicação Geográfica, que protege um produto original de cópias; a farinha seria reconhecida como Indicação de Procedência – IP, um dos tipos de certificados de origem, em agosto de 2019.
O vídeo feito pela equipe hoje está no site da Confederação Nacional da Indústria como um dos 19 pequenos documentários já produzidos pela Agência CNI de Noticias na primorosa série especial “O Brasil que a gente produz” sobre o valor de produtos com Indicação Geográfica que vem sendo realizada desde 2018 na forma de reportagens, vídeos e ações em redes sociais. Ao lembrar da produção deste filme, Ariadne Sakkis, Editora de Conteúdo da Agência CNI e diretora da série, quase sempre se emociona, como me confessou na entrevista: “Me emociono com uma frequência até indesejada. Vivo chorando nas entrevistas desta série”.
Ela tem razão em se emocionar, porque estes produtos estão íntimamente relacionados com o território e as pessoas. Mais do que produtos, refletem vidas e patrimônios, como você vai ver em seguida. Ariadne é formada em Jornalismo e Publicidade e especialista em Relações Internacionais. Antes da CNI, onde está desde 2014, trabalhou no jornal Correio Braziliense. Há 2 anos é a gerente de Conteúdo Multimídia da CNI e em 2018 começou a série sobre produtos com Identidade Geográfica. Veja a entrevista a seguir.
Rogerio Ruschel – A CNI reúne organizações como o SESI, o SENAI e o IEL. Qual o papel destas entidades? Como a Agência CNI se integra neste contexto?
Ariadne Tamm Sakkis – A Agência CNI é o veículo de jornalismo oficial dos departamentos nacionais do SESI – Serviço Social da Indústria que promove a saúde a segurança no trabalho e educação de excelência dos trabalhadores, do SENAI – Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial que qualifica profissionais e é parceira da indústria com pesquisa, tecnologia e inovacão e do IEL – Instituto Euvaldo Lodi, que atua na formação executiva de lideranças empresariais – todos coordenados pela CNI.
Rogerio Ruschel – Como o Acordo Mercosul e União Européia de Livre Comércio assinado em junho de 2019, de importância estratégica para produtos com IGs, vem sendo percebido na CNI?
Ariadne Tamm Sakkis – O acordo jogou luz nesse assunto. Se você reparar, os grandes veículos de comunicação passaram a enxergar o universo de indicações geográficas em função do peso que os negociadores europeus deram ao tema ao longo de todo a discussão do acordo. Faz sentido porque, há séculos, eles já se deram conta do potencial de suas criações mais peculiares e as protegem com muito empenho. A proteção desse ativo intelectual é uma constante não só dos acordos que a União Europeia negocia como bloco, mas também dos acordos bilaterais negociados pelos países europeus.
A CNI vem, desde 2018, dando destaque para o potencial e o valor das indicações geográficas por meio do projeto O Brasil que a Gente Produz, um especial que conta as histórias das IGs brasileiras, que são a combinação entre pessoas e seus territórios. Já são duas temporadas da série, que conta com reportagens, vídeos e ações em redes sociais.
Rogerio Ruschel – A CNI tem trabalhado na valorização da bioeconomia, da diversidade ecológica, do Protocolo de Nagoia e da sustentabilidade como um todo. Como o tema dos ativos naturais vem sendo tratado pela Agência CNI?
Ariadne Tamm Sakkis – Como você mesmo já adiantou, produzindo muitos conteúdos (especiais ou factuais) acompanhando as discussões. Nós, do jornalismo, trabalhamos em muitas parcerias com as áreas técnicas para ajudar a divulgar, desmitificar e popularizar temas mais árduos. O caso da propriedade intelectual (PI) é bastante simbólico. Com a ajuda da comunicação, conseguimos simplificar conceitos duros e traduzir a importância da PI no dia a dia das pessoas. Veja, estamos no meio de uma pandemia e quem saiu na frente na corrida das vacinas? Quem investiu pesadamente (e sistematicamente) em inovação, em pesquisa, em educação. E a propriedade intelectual permeia tudo isso, só que ainda falta fazer mais pontes entre o que sai de um laboratório e a vida das pessoas. Nosso papel, enquanto jornalistas, é esse.
“Se o Brasil, sozinho, tem 20% da biodiversidade do mundo, podemos atrelar nosso desenvolvimento ao uso racional e sustentável do que o nosso território nos oferece. Nesse aspecto, a indicação geográfica é como uma coroação do saber fazer.”
Rogerio Ruschel – Como valores da bioeconomia podem ser ampliados com a estratégia das Indicações Geográficas?
Ariadne Tamm Sakkis – Estou muito longe de ser uma grande conhecedora da bioeconomia, mas até onde sei, a estratégia é aproveitar a riqueza da sua biodiversidade para criar soluções com mais sustentabilidade, inteligência e inovação. Se o Brasil tem, sozinho, 20% da biodiversidade do mundo, há possibilidades praticamente infinitas de atrelar o nosso desenvolvimento econômico e social ao uso racional e sustentável do que o nosso território nos oferece. Nesse aspecto, a indicação geográfica é como uma coroação do saber fazer. Pensemos no cacau, fruto amazônico; pensemos no guaraná; no própolis; nos usos ainda desconhecidos das plantas que temos, das frutas. Claro que faz sentido! O que falta são políticas e programas que concatenem os elos da produção. É aí que instituições como a CNI podem ajudar.
Rogerio Ruschel – Como, quando e porque a CNI decidiu produzir a série “O Brasil que a gente produz” sobre Indicações Geográficas?
Ariadne Tamm Sakkis – Atuo na CNI há 7 anos. Nos primeiros 5, fui assessora de imprensa na área de propriedade intelectual. Por muitos anos, a indústria centrou seus esforços em resolver o dilema das patentes, da demora absurda para analisar os pedidos. Estudando o tema de PI, me deparei com as indicações geográficas. Foi uma paixão imediata. Fiz cursos na OMPI, no INPI, e, com a ajuda da Maria Cláudia Nunes, à época especialista em PI da CNI, aprovamos o projeto dessa série especial para mostrar o que são as IGs brasileiras e por que temos de valorizá-las. Começamos com 3 produtos muito famosos: o café do Cerrado Mineiro, o queijo Canastra e o vinho do Vale dos Vinhedos. De quebra, ainda conseguimos mostrar os desafios de uma comunidade amazonense em busca da sua IG para a farinha de Uarini.
O resultado foi surpreendente, pela aceitação, audiência e interesse do público sobre o tema. Afinal, estamos falando de patrimônios brasileiros e contando as histórias de quem os faz. Não tem como não gostar. Dentro da CNI, o projeto também ganhou outros pais e mães, como o Diego Campos, nosso cinegrafista e editor, e a Joana Pericás, coordenadora de redes sociais, que fez um trabalho brilhante ao levar as IGs para influenciadores digitais.
Em 2019, diante desse sucesso, nos programos para fazer uma nova “temporada”, produzida entre 2019 e 2020, na qual falamos sobre a erva-mate de São Mateus do Sul, do cacau do Sul da Bahia e da cachaça, a única IG de âmbito nacional que temos. O que acho que temos conseguido mostrar é que a indústria também tem origem, também envolve pessoas, que dedicam suas vidas a aperfeiçoar uma producão. Mostramos também que, ao contrário do que muita gente pensa, a indústria, muitas vezes, nasce e sobrevive num âmbito familiar, do envolvimento de gerações com um território e do conhecimento que atravessa os anos, sendo sofisticado, oxigenado com a modernidade.
Rogerio Ruschel – Qual o video mais dificil de realizar? Por que?
Ariadne Tamm Sakkis – A história do cacau, particularmente, foi uma das mais difíceis pelo histórico de luta, violência, ascenção e queda da região Sul da Bahia. Essas marcas estão vivas em quem segue cultivando o cacau e reescrevendo a história do chocolate brasileiro. Demorei muito para escrever a matéria e fechar o vídeo. Tinha que encontrar um balanço entre saga e ressureição porque é isso que essa região vive. O vídeo de Uarini também foi desafiador, e aqui devo agradecer meu colega Aerton Guimarães, que estava no Amazonas fazendo outro projeto, do Samaúma, o barco-escola do SENAI, e pode nos ajudar. Uarini é um local de difícil acesso, o deslocamento é só por barco, então a logística foi difícil.
Rogerio Ruschel – Qual o video que você sugere (e permite) que seja publicado com link para os leitores de “In Vino Viajas”?
Ariadne Tamm Sakkis – Pelo público, iria com o VInho do Vale e o queijo Canastra. Mas qualquer um é muito legal. Eu sou suspeita para falar!
Veja o video do queijo canastra aqui: https://noticias.portaldaindustria.com.br/especiais/o-que-que-a-canastra-tem/
Rogerio Ruschel – Quais os produtos ou serviços com IGs serão os próximos?
Ariadne Tamm Sakkis – A pandemia dificultou tudo. Ainda não temos essa definição. Quem sabe em breve.
Rogerio Ruschel – Como a série vem sendo recebida internamente na CNI, por seus dirigentes e pelos empresários em geral? E por outros públicos externos?
Ariadne Tamm Sakkis – Como eu falei antes, a série foi muito bem recebida. De quebra, também nos ajudou a materializar esse assunto para a imprensa, o que me deixa muito feliz. Os retornos não poderiam nos deixar mais orgulhosos.
Rogerio Ruschel – Em uma entrevista você disse que se apaixonou pelo tema porque conta histórias de pessoas? Como funciona isso?
Ariadne Tamm Sakkis – Porque essa relação entre terra, atmosfera e gente é muito bonita. Em São Mateus do Sul, por exemplo, me emocionei com a Casa da Memoria Padre Bauer, que preserva a história da erva-mate, desde os registros de usos por povos indígenas até a chegada de milhares de imigrantes italianos e poloneses que tomaram amor por essa planta pra eles exótica e por essa terra distante de seus berços. Você pode optar por se ater ao produto, como ele é feito, dados técnicos, etc, mas se você conta isso pela perspectiva de quem os faz, tudo ganha outra dimensão. Veja os jovens refazendo a Canastra, recuperando a tradição de curar o queijo, que foi uma obra de destino e distância entre as Gerais e Rio e São Paulo. Me emociono com uma frequência até indesejada. Vivo chorando em entrevista. Ahahhahahhaha.
“A minha geração quer saber isso, quer consumir algo que faça sentido e que tenha propósito. A gente vive esse momento de valorizar o local, o que tem origem, mão humana.”
Rogerio Ruschel – A certificação de produtos e serviços culturais com Identidade Geográfica protege também serviços culturais como o saber-fazer, o folclore, a dança e as indústrias criativas. Como a Agência CNI pretende trabalhar as IGs da indústria criativa?
Ariadne Tamm Sakkis – Cenas dos próximos capítulos!
Rogerio Ruschel – Empreendedores brasileiros parecem estar descobrindo a importância das IGs. E sobre os consumidores? Você considera isso uma tendência definitiva e irreversível?
Ariadne Tamm Sakkis – Considero, sim. As Indicações Geográficas ajudam a responder novas velhas perguntas: onde isso foi feito? Quem fez? Como é feito? Por que isso é feito, onde é feito? A minha geração quer saber isso, quer consumir algo que faça sentido e que tenha propósito. Há uma mudança no drive do consumidor, muito em função das pressões ambientais, da necessidade de sermos mais sustentáveis e pensarmos que o ato da compra é um ato de apoio. A gente vive esse momento de valorizar o local, o que tem origem, mão humana. A indústria também é parte disso.
Viaje pela série a partir daqui: https://noticias.portaldaindustria.com.br/especiais/indicacao-geografica-o-redescobrimento-do-brasil/
Saiba mais aqui: https://invinoviajas.com/?s=indica%C3%A7%C3%B5es+geo